quarta-feira, abril 01, 2009

Psicologia Transpessoal


A Psicologia Transpessoal usa elementos de outras escolas de psicologia, tais como behaviorismo, psicanálise, psicologia analítica (Junguiana), psicologia humanista, e, especificamente estuda estados de consciência que transcendem a pessoa e o conceito do ego. Por isso a psicologia transpessoal pode ser definida como o estudo científico de estados de consciência.

O modelo de psicologia transpessoal é muito semelhante ao modelo quanta-relativístico da física moderna sub-atômica (veja: Matos, 1978), i.e., modelos que procuram apresentar um ponto de vista integrado da teoria de quantum e relatividade . Aqui o universo todo (matéria/energia) é uma entidade dinâmica em constante mudança num todo indivisível.
Neste contexto Capra (1975) diz:
"Na física moderna, o universo é então experienciado como um todo dinâmico e inseparável que sempre inclui o observador de uma maneira essencial. Nesta experiência os conceitos tradicionais de espaço e tempo, de objetos isolados, e causa e efeito, perdem o seu sentido."
O começo da ciência moderna foi precedido e acompanhado pelo desenvolvimento de um pensamento filosófico que levou o homem a uma formulação extrema do dualismo espírito/matéria. Reneé Descartes expressou o seu ponto de vista do universo como sendo dividido em dois reinos separados; o da mente (res cogitans) e o da matéria (res extensa). Este ponto de vista cartesiano levou os cientistas a compreenderem a matéria como algo morto e completamente separado de si mesmos (a "realidade objetiva científica"); e a compreender o universo como quase uma infinidade de objetos separados (Capra, 1975).
Tal ponto de vista mecanicista foi aceito por Isaac Newton que construiu a sua teoria mecânica baseado neste mesmo ponto de vista e fez dela o fundamento da física clássica. Esse ponto de vista cartesiano e newtoniano teve um tremendo impacto no pensamento e consciência ocidental. Então o homem começou a equacionar a sua identidade (isto é; aquele que ele pensava que era) com sua mente, com sua auto-imagem. Estes postulados filosóficos que levaram a formulação da física clássica são um produto da maneira como o ser humano experiencia a realidade num estado de consciência usual (Ordinary State of Consciousness).
REALIDADE
A realidade é experienciada diferentemente por cada indivíduo em momentos diferentes de sua própria existência.
Nós sabemos que a experiência da realidade, ou melhor, das realidades, depende de vários fatores, como, por exemplo, nosso condicionamento social, os estímulos de consciência que experienciamos em certos momentos de nossa vida.Num estado usual (ordinário) de consciência (OSC - Ordinary State of Consciousness) nós assimilamos e interpretamos as informações que nos são transmitidas pelos nossos sentidos em unidades de significância. Nós olhamos o mundo ao nosso redor e nossos olhos selecionam certas informações as quais "arquivamos" como um quadro parcial da realidade física. Nossos sentidos não são capazes de apreender o todo processual e dinâmico do nosso modo de existir , no nosso universo interno e externo. Nós vemos o mundo como composto de muitas coisas diferentes, as quais são separadas umas das outras por espaço; e consequentemente nos tornamos conscientes de um filme interior (produto do processo de re-cognição), de um mundo composto de objetos mais ou menos estáticos. Se eu olho, por exemplo, para o sólido e elegante edifício da Biblioteca Real da Dinamarca (Den Danske Kongelige Bibliotek) em Copenhague, estarei, de certa forma, experienciando aquela construção, formidável e sólida, como algo quase eterno. Eu, certamente, não pensarei na possibilidade de que aqueles materiais que compõem aquele edifício não estavam ali, naquele lugar, a quinhentos anos atrás, e nem tampouco chegarei a pensar que todos aqueles materiais compostos de moléculas e átomos estão em movimento e transformação constante. Eu não sou capaz de perceber este edifício se envelhecendo aqui e agora, mas, em realidade, em cada segundo, este edifício, aparentemente tão sólido e elegante, está em constante deteriorização; e mesmo que conservado e concertado muitas vezes, num tempo mais distante, aqueles materiais que hoje fazem este edifício, dispersados pelo vento do tempo, não mais estarão ali.
Este modo de perceber, que é uma conseqüência psicológica da dimensão cognitiva humana, faz com que, dificilmente, estejamos conscientes da transformação constante que acontece em nosso corpo agora e em cada momento desde o nascimento até a morte. Este modo específico de aprender a realidade, é, provavelmente, a causa principal pela qual conceptualizamos o universo de uma maneira dualística, criando, freqüentemente, rígidas separações entre eu e você, corpo e mente, vida e morte.
CONSEQUÊNCIAS DO DUALISMO
As conseqüências existenciais da maneira dualística, pela qual nos tornamos conscientes de nosso universo, refletem em nosso meio ambiente criando um espectro social de conseqüências bem interessantes. Este modo específico de se tornar consciente de algo, freqüentemente faz com que o indivíduo se sinta como um ego isolado, navegando num oceano mais ou menos perigoso; aonde ele tem que garantir para si mesmo estratégias específicas, para sobreviver numa sociedade específica. Seu objetivo, que é basicamente o mesmo objetivo, consciente ou inconsciente, de cada ser humano, será o de obter um estado de prazer e segurança num contexto físico, psicológico e social. Para atingir seus objetivos, mais próximos ou mais distantes, ele agirá (e reagirá!) com seu mundo social. É um fato lógico que ele agirá e reagirá com a vida de acordo com o modo pelo qual está consciente do universo. E, lidando com o universo fundamentado numa visão imprecisa (o modo pelo qual usualmente se é consciente do universo e de si mesmo) ele obterá resultados similares. Ele pode obter um estado de "felicidade" temporária mas sempre se sentirá, consciente ou inconscientemente, ameaçado pelo seu meio ambiente e pela possibilidade de perda, de ser mesmo ferido e eventualmente morrer.
Num contexto dualístico, o ser humano está vivendo em pelo menos dois mundos diferentes: um, é o meio físico da sua vida diária; e o outro, é o seu mundo conceitual, i.e., os seus pensamentos, cognição, re-cognição e o modo como organiza e percebe a quase infinidade de informações que ele recebe de seu universo interior e do universo ao redor de si mesmo. Neste caso, ele está criando uma realidade consensual, a qual ele entende e compreende em unidades de significância, num contexto linear de passado, presente e futuro.
A AUTO-IMAGEM
Parece que esta realidade criada, conceitualmente de separação rígida (eu e o mundo), começa naquele momento em que nascemos e somos anatômicamente separados de nossas mães; e, mais especificamente, quando nós aprendemos um sistema de código chamado linguagem. Uma das primeiras unidades de significância que nós aprendemos neste sistema de linguagem é o conceito do eu, ou ego para identificar este ego eu preciso separar e adicionar certas qualidades para ele. Desta forma, eu crio uma imagem de mim mesmo. Esta imagem não é realmente permanente e muda no curso da vida do indivíduo. Ali tem certos elementos que são mais ou menos constantes nesta imagem (ou identidade), tais como: o sexo, a qualidade de ser um ser humano, etc. Existem, na auto-imagem, outros atributos que podem variar com o tempo, como por exemplo: o status social e financeiro, sentimentos, qualidades pessoais e capacidades.
Desta maneira, o ser humano organiza e re-organiza a sua imagem acreditando saber quem ele é. Ele se identifica. E esta identidade aparece para ele, algumas vezes como sendo mui agradável e algumas vezes desagradável; tudo dependendo de como o futuro deveria ser (procurando eternizar ou programar o futuro de uma certa maneira). Ela tem expectativas e esperanças que as pessoas, ela mesma e situações se realizarão, mais ou menos, dentro daqueles padrões que ela pré-fabricou ou planejou. Quando o mundo não reage às fantasias que ela criou, de como as pessoas/situações deveriam ser, se sente frustrada e reprime estas situações desagradáveis. Desta forma, esta pessoa está guardando situações traumáticas como blocos de energia estática, ou, em outras palavras, está bloqueando ou armazenando dor.
Outras fontes de "dor armazenada", ou traumas, são situações que indivíduo experienciou desde sua vida pré e perinatal até todas as experiências no nível psicodinâmico, onde a pessoa não teve a possibilidade de preencher as suas necessidades naturais de desenvolvimento (proximidade e calor humano materno na primeira infância, condições físicas adequadas para um desenvolvimento fisiológico normal, segurança emocional proporcionada pelos pais e o seu ambiente em geral, estímulo intelectual apropriado, etc.).
As frustrações e situações traumáticas, as quais a pessoa não foi capaz de expressar, foram impressas na auto-imagem (ego), e mais tarde, eventualmente, reprimidas (esquecidas mas ainda bem vivas no subconsciente, como um filme com conotações emocionais dolorosas). Estas situações dolorosas, agora reprimidas e bloqueadas, podem aparecer como problemas mentais e/ou sintomas corporais tais como tensão, dor e mesmo doenças psicossomáticas.
Podemos dizer que a criação do ego (auto-imagem) é o ponto inicial da vida pessoal (de "persona" que em latim quer dizer: "máscara do ator") do ser humano. Quando o indivíduo transcende o ego (o qual é um conceito), ele/ela vivencia uma experiência transpessoal. Aqui poderíamos dizer que o indivíduo no nível pessoal ( como uma "persona") está experienciando uma realidade cartesiana/newtoniana; enquanto que, no nível transpessoal ele pode ser capaz de experienciar a realidade descrita pela física moderna atômica e sub-atômica.
Fritjof Capra, que fez pesquisa em física de alta-energia, na Universidade de Paris, na Universidade da Califórnia em Santa Cruz, e em várias outras universidades, começa seu famoso livro o Tao da Física, explicando como uma experiência transpessoal, o levou a descobrir experiencialmente as "verdades" da física moderna:
"Há cinco anos eu tive uma experiência muito bela a qual me colocou no caminho que acabaria por resultar neste livro. Eu estava sentado na praia, em uma tarde, já no fim do verão, e observava o movimento das ondas, sentindo ao mesmo tempo o ritmo de minha própria respiração. Nesse momento, subitamente, apercebi-me intensamente do ambiente que me cercava: este se me afigurava como se participasse de uma gigantesca dança cósmica. Como físico, eu sabia que a areia, as rochas, a água e o ar a meu redor eram feitos de moléculas e átomos em vibração e que tais moléculas e átomos, por seu turno consistiam em partículas que interagiam entre si através da criação e da destruição de outras partículas. Sabia, igualmente, que a atmosfera da Terra era permanentemente bombardeada por chuvas de "raios cósmicos", partículas de alta energia e que sofriam múltiplas colisões à medida que penetravam na atmosfera. Tudo isso me era familiar em razão de minha pesquisa em Física de alta energia; até aquele momento, porém, tudo isso me chegara apenas de gráficos, diagramas e teorias matemáticas. Sentado na praia, senti que minhas experiências anteriores adquiriam vida. Assim, "vi" cascatas de energia cósmicas provenientes do espaço exterior, cascatas nas quais, em pulsações rítmicas, partículas eram criadas e destruídas. "Vi" os átomos dos elementos - bem como aqueles pertencentes a meu próprio corpo - participarem desta dança cósmica de energia. Senti o seu ritmo e "ouvi" o seu som" (Capra, 1975).
Grof (1972), que trabalhou com pesquisa de drogas psicodélicas durante quase duas décadas, e que é um dos pioneiros do enfoque científico transpessoal no Ocidente, diz:
"A experiência transpessoal é então definida como uma experiência envolvendo uma expansão e extensão da consciência mais além dos limites usuais do ego e as limitações de tempo e espaço. No estado de consciência "normal", ou usual, o indivíduo experiencia a ele mesmo como existindo dentro dos limites de seu próprio corpo físico (a imagem do corpo) e a sua percepção do meio ambiente é restringida pela capacidade limitada de seus exteroceptores; ambas, as suas percepções internas e suas percepções do meio ambiente, são confinadas dentro dos limites de espaço-tempo. Em experiências psicodélicas transpessoais, uma ou mais destas limitações parecem ser transcendidas.Em alguns casos, o sujeito experiencia a perda dos limites usuais de seu ego, e sua consciência parece expandir para incluir outros indivíduos e elementos do mundo exterior. Em outros casos, ele continua experienciando sua própria identidade, mas num tempo diferente, e num contexto diferente. Ainda, em outros casos, o sujeito experiencia um desaparecimento total da identidade de seu ego e uma identificação total com a consciência de outra entidade. Finalmente, em uma categoria bem grande destas experiências psicodélicas transpessoais ( experiências arquetípicas, encontros com divindades pacíficas e raivosas, união com Deus, etc.), a consciência do sujeito parece abranger elementos que não têm nenhuma continuidade com sua identidade, os quais não podem ser considerados como simples derivados de suas experiências no mundo da realidade tri-dimensional."

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